Gari com Doutorado
Por Luiz Eduardo Farias | 09/12/2009 | Educação(Folha de São Paulo – outubro de 2009)
Bom, nem sei por onde começar...
Confesso que fiquei alguns segundos tentando digerir a informação acima. E, para ser sincero, não sei qual é a melhor análise a se fazer sobre a notícia.
Vou tentar seguir uma explicação e espero que consiga argumentar bem a minha tese.
Estas pessoas mencionadas no texto teoricamente poderiam estar concorrendo a vagas com o nível de exigência bem maior. Porém, a opção pelo concurso da Comlurb é fruto, segundo eles, da falta de mercado em suas áreas e da segurança que um serviço público proporciona.
Vamos primeiro debater sobre as duas justificativas.
Por mais saturado que seja o mercado de trabalho, como é o caso do direito, não faltam vagas. As empresas, pelo contrário, sentem dificuldades de contratarem profissionais. No entanto, a exigência é grande e o simples fato de ter um diploma não garante a qualificação do sujeito. Muitas profissões procuram pessoas com conhecimento em informática, em língua estrangeira, com boa bagagem cultural e/ou elementos pessoas como liderança, bom relacionamento inter-pessoal etc.
Em resumo, o desemprego é fruto da falta de qualificação. Pessoas capacitadas, se desempregadas, estão procurando emprego no lugar errado. Vagas não faltam.
Só para finalizar, como citei o caso do direito... quantos concursos públicos são realizados durante o ano nesta área? Inúmeros, não! Mesmo que não seja no direito, dezenas de concursos públicos são feitos todos os anos para a contratação de pessoas em nível superior.
Este último ponto nos leva a segunda justificativa: a estabilidade no emprego.
Concordo que a estabilidade no trabalho é uma das grandes conquistas que o trabalhador pode ter. Afinal de contas, sair de casa para trabalhar e não saber se você será o próximo da lista é altamente estressante.
Para quem não quer viver esta situação o setor público é o paraíso. De lá você só sai se fizer muita força. E só entra se tiver competência.
Não é difícil passar num concurso. Se a pessoa tiver um bom histórico escolar e estudar um pouco é o suficiente.
E este último ponto é exatamente o que quero sublinhar.
Chamo a atenção pra você, leitor que me atura, pensar comigo... se uma pessoa tem um doutorado significa que ele passou no mínimo do mínimo 8 anos tendo contato com professores do primeiro time – a elite do magistério do país. Este doutor persegue a vaga de gari... Então eu faço a seguinte indagação: todos os professores que passaram em sua vida foram incompetentes na sua missão de ensinar ou este aluno fracassou e provavelmente passou a trancos e barrancos até conseguir o diploma de doutor?
Quando eu digo fracassou não é um menosprezo pela profissão de gari... longe disso. Só não dá pra entrar na minha cabeça como pode uma pessoa estudar quase 20 anos da sua vida pra limpar o lixo da cidade.
Talvez a resposta esteja, em parte, para um breve relato sobre a minha vida na universidade.
Como alguns de você já sabem, estudei numa faculdade particular. E assinando embaixo do que disse um reitor de uma desta faculdades, o aluno da faculdade particular chega em um nível menor do que o seu colega da pública. O trabalho dos professores é mais árduo e deve ser feito mais rápido a ponto de que passados 4, 5 ou 6 anos este aluno tenha o mesmo nível do seu colega da pública.
Para encurtar a questão, preciso dizer que no último período da faculdade era comum ter alunos na minha turma que não sabiam escrever uma redação, interpretar corretamente um texto e/ou elaborar um argumento convincente para defender uma hipótese.
Mais do que isso, muitos deste ganharam o diploma deste jeito, apresentando monografias medíocres.
Mais do que isso, tenho uma colega de faculdade que fez pós-graduação em seguida e me "contratava" para elaborar resenhas de livros pra ela. E não é porque ela não tinha tempo pra fazer... é porque não sabia mesmo.